05/02/2012

Pão e circo

Chama-se "Agora é que conta", passa na TVI" e é apresentado por Fátima Lopes.

O programa começa com dezenas de pessoas a agitar uns papéis. E os papéis são contas por pagar. Reparações em casa, prestações do carro, contas da eletricidade ou de telefone. A maioria dos concorrentes parece ter, por o que diz, muito pouca folga financeira.

E a simpática Fátima, sempre pronta a ajudar em troca de umas figuras mais ou menos patéticas para o País poder acompanhar, presta-se a pagar duzentos ou trezentos euros de dívida. "Nos tempos que correm", como diz a apresentadora - e "os tempos que correm" quer sempre dizer crise - , a coisa sabe bem.

No entretenimento televisivo, o grotesco é quase sempre transvestido de boas intenções.

Os concorrentes prestam-se a dar comida à boca a familiares enquanto a cadeira onde estão sentados agita, rebolam no chão dentro de espumas enormes ou tentam apanhar bolas de ping-pong no ar. Apesar da indigência absoluta do programa, nada disto é novo. O que é realmente novo são as contas por pagar transformadas num concurso "divertido".

Ao ver aquela triste imagem e a forma como as televisões conseguem transformar a tristeza em entretenimento, não conseguimos deixar de sentir que esta é a "beleza" televisiva onde tudo se vende, até as pequenas desgraças quotidianas de quem não consegue comprar o que se vende.

Houve um tempo em que gente corajosa se juntava para lutar por uma vida melhor e combater quem os queria na miséria. E ainda há muitos que não desistiram. Mas a televisão conseguiu de uma forma extraordinariamente eficaz o que os séculos de repressão nem sonharam: pôr a maioria a entreter-se com a sua própria desgraça. E o canal ainda ganha uns cobres com isso. Diz-se que esta caixa mudou o Mundo.


Entretanto a apresentadora recebe 40.000 euros por mês. Foi o valor da transferência da SIC para a TVI. Uma proposta irrecusável segundo palavras da própria.

A pobre da Fátima Lopes só ganha 1290 euros por dia. Brincando com miséria dos miseravelmente felizes.