13/03/2010

As mentiras de Vieira

Sérgio Vieira (Tete, Moçambique, 1941), secretário pessoal de Samora Machel para quem escrevia os livros de teoria marxista, criminoso da ditadura com vários cadáveres no seu currículo, autor de violência doméstica sobre as várias mulheres que teve, poeta medíocre e irmão de um conhecido enterteiner português, lança-se agora nas suas "memórias".

Mentiroso compulsivo, provocador racista recalcado, acaba por se desmacarar nos seus próprios relatos (in «Diário Independente»):

A história "aristocrática" da família está bem contada no «Tal & Qual»:

José Castelo Branco, o mais popular concorrente da "Quinta das Celebridades", gaba-se de descender de uma linhagem de famílias reais europeias, mas a "nobreza" de san­gue do "marchand" encontra-se em África, precisamente em Moçambique. Sérgio Vieira, o seu irmão mais velho, é uma figura de vulto naquele território africano: foi braço-direito de Samora Machel, co-fundador da Frelimo, ex-ministro da Segurança e é agora diretor do maior programa de desenvolvimen­to de Moçambique, o Projecto do Vale do Zambeze, entre muitos outros cargos de relevo exercidos desde há anos.

Ao contrário do polémico "conde de White Castle", o seu irmão é uma celebridade que prima pela discrição. E que não se importa de arregaçar as man­gas quando se trata de trabalhar. Enquanto José Castelo Branco saltita, de Chanel, entre as couves da Quinta da Baracha, Sérgio Vieira passou a última semana, incontatável, em peregrina­ção pelas localidades pobres onde começam a florescer infra-estruturas hidráulicas e complexos agro-industriais, aproveitando os recursos do maior rio de Moçambique.

Apesar da polémica à volta do concurso da TVI e da participa­ção de Castelo Branco, Sérgio Vieira alega não saber nada so­bre o assunto. "Por onde tenho andado, não vejo televisão, nem tenho tido contatos telefónicos. Nada mesmo! Além disso, é um tipo de programas que eu não vejo", sublinha o ex-deputado em conversa com o "T&Q". Nem sequer a mãe, Nini, tem relatado ao filho mais velho as aventuras agrárias do negociante de arte.

Sérgio Vieira assume ao "T&Q" que nunca foi um irmão presente durante a infância e adolescência de Castelo Branco. "Quando ele nasceu, eu estava na guerra, depois entrei na Frelimo, por isso praticamente não o conheci nessa altura". Nem nas décadas de 60 e 70, nem nas seguintes. "Quando ele partiu para Portugal, foi com os nossos pais, estudar não me lembro o quê para a Escola António Arroio, se não estou em erro".

Sérgio Vieira parece desconhecer grande parte da vida de Castelo Branco. Garante que há "contatos regulares", mas a última vez que se encontraram aconteceu no ano passado, numa visita-relâmpago ao nosso País, a convite do presidente da Assembleia da República. "Não estive em casa dele, ele vive afastado de Lisboa e não deu para ir até lá", conta.

Apesar de afiançar que as relações entre ambos são "perfeitamente normais", o "T&Q" soube que o político nunca aceitou a exuberância de Castelo Branco. "O irmão quase o escorraçou de Tete, não convivia muito bem com os gestos amaneirados do Zé. Já na altura era gozado, e ti­nha uma alcunha depreciativa de que agora não me recordo", revela ao "T&Q" um familiar de Cas­telo Branco, que preferiu manter o anonimato. Sérgio Vieira desmente, garantindo que nunca chegou a aperceber-se que o irmão era o homem excêntrico que agora preenche as conversas de muitos portugueses. "Nunca estive com ele durante a infância, estive mais perto da minha irmã", volta a salientar.

Sérgio Vieira reside no bairro de Sommerschield, em Maputo, com a mulher e os quatro filhos - os sobrinhos de Castelo Branco. "É um sítio onde vivem pessoas de elite", conta ao "T&Q" um jornalista do "Diário de Moçambique". Nesse bairro estão igualmente instaladas embaixadas como a dos Estados Unidos, uma clínica e a sede da Frelimo, o partido no poder que ajudou a fundar. Basta-lhe sair de casa e atravessar algumas ruas para lá chegar, embora a maior parte da sua atividade se desenrole hoje na região do Tete, onde nasceu - ele e Castelo Branco.

Acusado de matar Samora Machel
Ao contrário do irmão, Sérgio Vieira prefere não ostentar sinais exteriores de riqueza. "Nunca deixa entender que tem dinheiro. Ë claro que tem um bom carro, como todos os outros políticos e empresários, mas nunca se vê, por exemplo, em es­tâncias de férias, como outros", continua o jornalista moçambicano.

No entanto, Sérgio Vieira que, soube-se esta semana, vai deixar de ser deputado pela Frelimo, cargo que ocupava na Assembleia da República, foi recentemente criticado por se dedicar mais aos insultos políticos do que ao Gabinete do Vale do Zambeze. "Continuou no Maputo a curtir as noites de luzes, a refrescar-se da brisa marítima das barreiras da Costa do Sol, onde se alojam, preguiçosamente, os novos ricos", desabafa-se num texto publicado na Internet.

Porém, o jornalista garante que Sérgio Vieira é um homem estimado. "Ele não é polémico. As pessoas gostam dele como um político da velha guarda e apreciam o que está a fazer pelo Zambeze", garante.

Mesmo assim, a Renamo, partido da oposição, não perde uma oportunidade para o envolver em diversos escândalos. "Sempre que os ânimos se exaltam, acusam-no de ter sido responsável pela morte de Samora Machel", conta o jornalista. Recor­de-se que Sérgio Vieira, além de amigo pessoal do antigo presi­dente moçambicano, que mor­reu em 1986, na sequência da queda do avião onde viajava era, na altura, ministro da Seguran­ça.

Esta não foi a única polémica onde se viu envolvido: "Foi acu­sado publicamente de ter morto algumas pessoas, isto na altura de Samora Machel. Ele próprio chegou a meter o caso em tribu­nal e nunca se reuniram provas suficientes", recorda o jornalis­ta. As acusações não o fazem calar. "É um dos intelectuais da sua bancada, dos pensadores mais ativos, dos que mais falam na Assembleia. E também o mais atacado", acrescenta.

"Orgulho-me dele"
Castelo Branco já recordou Sérgio Vieira por diversas vezes, em entrevistas e agora na "Quinta das Celebridades". "Tenho um irmão que está em Moçambique, Sérgio Vieira, que é político. Estudou cá, nas Caldinhas, em Santo Tirso, e formou-se em Direito. Aliás, é amigo pessoal do presidente Jorge Sampaio e de uma série de dirigentes da época", disse em entrevista à revista "Caras", em Abril do ano passado. A serem verdade os rumores que dão conta da relação conflituosa com o irmão mais velho, Castelo Branco apa­renta não guardar rancor: "O meu irmão sempre foi coerente e abraçou a causa que ainda hoje defende. Orgulho-me muito dele", acrescentou.

O inteletual da família
E tem motivos para isso. O "cérebro" da fa­mília não só frequentou a Faculdade de Direito de Lisboa, entre 1959 e 61, curso que viria a prosseguir na Universidade de Paris até 63, como tirou uma licenciatura de Ciências Políticas na Universidade de Argel, na Argélia, e ainda fez estudos políticos no Colege d'Europe, na Bélgica. Regressado a Moçambique, foi combatente da Luta de Libertação Nacional até 1974, seguindo depois para a direção do Gabinete de Samora Machel, até 77. Foi ainda, antes de se tornar Ministro da Segurança, em 1984, Governador do Banco de Moçambique e Ministro da Agricultura - função que acumulou com os cargos de vice-ministro da Defesa e de Governador do Niassa.

No auge da carreira de Sérgio Vieira, já José Castelo Branco tinha rumado a Portugal. Dois ou três anos depois de vir para o nosso País, com o irmão a milhares de quilómetros, o marchand sentiu-se com liberdade suficiente para criar a sua Tatiana Valeska Romanov, uma figura que muitos conhecem da noite lisboeta, ape­sar de a celebridade garantir que aquela mu­lher exuberante apenas desfilava. "Isso é mentira! Passava a vida no Finalmente, uma discoteca 'gay', e fazia shows de travesti noutras casas", garante o mesmo familiar que vive em Portugal. Já na década de 80, casa com Maria Arlene, assistente de Fialho Gouveia no programa "Arca de Noé" (RTP1). Mas as saias e a maquilhagem continuam a transformá-lo em Tatiana.

Sérgio Vieira, reputado político, professor universitário, es­critor e investigador científico, entre muitas outras atividades, nem desconfiava que, em Portugal, o irmão Castelo Branco inundava a noite com purpurinas.

O homem dos sete instrumentos
Nome: Sérgio Vieira
Local de nascimento: Tete (centro de Moçambique)
Estado civil: casado Filhos - quatro
Formação académica - licenciado em Ciências Políticas na Universidade de Argel (Argélia), em 1967; estudou Direito na Fa­culdade de Direito de Lisboa entre 1959 e 61; estudou Direito na Universidade de Paris entre 1961 e 63; fez estudos políticos no Colege d'Europe (Bélgica) em 1962.

Atividades políticas e profissionais: antigo combatente na luta de libertação de Moçambique; diretor do gabinete do Presidente Samora Machel (1975/77); governador do Banco de Moçambique (1978/81); ministro da Agricultura (1982/83); governador do Niassa (1983/84); vice-ministro da Defesa (1983/84); ministro da Segurança (1984/87); professor na Universidade Eduardo Mondlane (desde 1987); diretor do Gabinete de Estudos Africanos (1987/92); escritor; consultor em Ciências Sociais; investigador científico do Centro de Estudos Africanos da UEM; membro da Organização Nacional de Professores; Organização da Juventude Moçambicana; Associação de Escritores Moçambicanos; diretor do Projecto do Vale de Zambeze (desde 2001); membro do Comité Central da Frelimo; deputado nas legislaturas 94/99 pelo círculo eleitoral do Tete pela bancada da Frelimo; deputado; mem­bro da comissão permanente da Assembleia da República; coronel na reserva.

O grande projeto do irmão
A zona do vale do Rio Zambeze é conside­rada pelos especialistas uma das regiões hidrográficas de maior potencial energético da África Austral. Além da criação de uma central hidroelétrica, o projeto dirigido por Sérgio Vieira prevê a ligação de populações pobres à Internet, a arborização da albufeira de Cahora Bassa, incentivos à pecuária e reflorestamento de grandes áreas.

Mas não é só: "No dia 5 de Outubro come­çou a nascer ali a maior linha ferroviária do Mundo!", congratula-se o político ao "T&Q", "Está tudo a correr perfeitamente e temos tido muitos incentivos do estrangeiro", diz-nos.

Vieira, eu?!
José Castelo Branco - ou José da Silva Vieira -, escolheu usar o apelido da família materna. O seu avô chamava-se Pedro Castelo Branco, um homem que o "marchand" alega ter começado como escrivão e que rapidamente chegou a solicitador. De acordo com um familiar do negociante de arte contatado pelo "T&Q", o apelido teria sido "oferecido" pelo patrão ao bisa­vô da celebridade, que nasceu na Guarda e foi trabalhar para a Índia. "O homem não tinha apelido e quando nasceram os pri­meiros filhos, o patrão ficou com pena e deu-lhes o próprio nome", conta.

A mãe, Inês Castelo Branco, mais conhecida por Nini, que vive com o filho e Betty Grafstein na vivenda de Sintra, casou-se com o indiano Francisco da Silva Vieira. O casal teve três filhos: Sérgio, Gabriela - que é veterinária em Portugal - e o "caçula" José.

André Barbosa
in «Tal&Qual», 15.10.2004