14/04/2010

Armando Emílio Staline

Terceiro mandato de Guebuza abordado no Comité Central - Balão de ensaio à porta fechada

A possibilidade de uma mexida constitucional para acomodar um terceiro mandato do atual presidente da República, Armando Guebuza, está a agitar alguns círculos restritos do poder, com uns a lançarem balões de ensaios para medirem o pulsar da opinião dos militantes sobre esta intricada matéria.

Ao que apurámos, na IV sessão extraordinária do Comité Central (CC) do partido Frelimo, no último fim-de-semana na cidade da Matola, esta questão foi levantada por um militante de base, durante os debates sobre o desempenho do partido nas eleições gerais e provinciais de Outubro passado.

O porta-voz da Frelimo, Edson Macuácua, confirmou que um militante do partido é que propôs que Armando Guebuza se recandidatasse a um terceiro mandato por ter conseguido levar o partido a uma vitória esmagadora nas eleições gerais do ano passado.

Mas Macuácua garantiu que Armando Guebuza, "nunca iria propor a revisão da Constituição para se candidatar a um terceiro mandato. Porém, a intenção já anunciada da Frelimo de alterar a lei mãe tem suscitado receios de que possa ser alargado para três o número de mandatos presidenciais: "Não há menor dúvida que a revisão da constituição é um imperativo nacional no sentido de que há vários aspectos de ordem legal, social, económica e política que precisam e carecem de ser reajustadas e adequá-las à ordem social actual", precisou Macuácua.

O próprio chefe do Estado moçambicano, já afastou a possibilidade de se recandidatar a um terceiro mandato, evocando o respeito pela Constituição e pelas leis.
"O camarada presidente Armando Guebuza foi claro e inequívoco reiterando a sua posição de sempre de que havia de respeitar a Constituição e as leis", sublinhou Macuácua.

A manchete do jornal «O País» sobre o assunto na edição de segunda-feira, no atual contexto, é vista não como uma "gaffe jornalística", mas como um balão de ensaio para testar a força de uma tal proposta ou, como alternativa, avançar-se com a candidatura da esposa, numa solução "à Argentina".

Chissano e Rebelo
Ao que o «Savana» apurou, o debate sobre o terceiro mandato foi lançado por Joaquim Chissano. No seu estilo de exímio diplomata, o antigo presidente fez referência às suas viagens ao exterior, aos contatos com diferentes interlocutores, nomeadamente internacionais, que o interrogavam sobre as vantagens da maioria qualificada, da possibilidade de se alterar a Constituição e abrir caminho a mais um mandato para o atual presidente. As nossas fontes fizeram questão em referir que Chissano, como também é seu estilo, evitou tomar posição na melindrosa questão.

Foi nesse contexto que o "militante de base" referido por Macuácua pediu a palavra para defender a alteração da Constituição para permitir um terceiro mandato a Guebuza. Segundo as nossas fontes, Teodoro Waty tentou intervir, mas foi bloqueado pelo presidium da reunião.

Foi então que Jorge Rebelo fez uma intervenção para clarificar as águas. Defendeu a atual Constituição "que foi feita por nós" e estabelece as regras de jogo para todos os candidatos, defendendo que, se havia dúvidas era bom que elas ficassem ali mesmo esclarecidas.
As nossas fontes dizem que a intervenção de Rebelo obrigou o presidente Guebuza a intervir referindo que a reunião do Comité Central não tinha sido convocada para se discutir a alteração da Constituição e a possibilidade de um terceiro mandato, deixando também claro, e frisando que já o tinha dito anteriormente, que a Constituição deveria ser respeitada e que não concorreria a um terceiro mandato.

Jorge Rebelo torna-se assim, mais uma vez, determinante em momentos cruciais nas reuniões do CC. Foi ele que fez a intervenção chave que obrigou ao afastamento de Chissano como candidato a mais um mandato em 2004 e a definição no Comité Central que o escolhido como secretário-geral seria o candidato presidencial, abrindo as portas à ascensão de Guebuza como presidente.

Francisco Carmona
in «Savana», 02.04.2010