22/04/2011

O país de tanga

Ver José Sócrates permitir-se acusar o PSD de "ânsia de poder" fez-me atirar o telecomando ao LCD. Aliás, o primeiro-ministro demissionário já me 'deve' vários eletrodomésticos em casa.

Este é o mesmo indivíduo que, dois dias antes de anunciar a vinda do FMI, dizia a um jornalista, em horário nobre, que só a pergunta sobre um hipotético pedido de ajuda externa o "ofendia". Este é o mesmo cavalheiro que baixou o IVA em 1%, prometeu um salário mínimo de 500 euros e a criação de pelo menos 100.000 empregos em ano de eleições.

Este é o sujeito da licenciatura ao domingo, o tipo que abandona o Parlamento quando vão falar os outros, o homem que nego­ceia um PEC com o estrangeiro sem dar Cavaco, o amigo de Khadafi e Chávez e Vara, apanhado ao telefone em conversas manhosas sobre personalidades e órgãos de media inquietantes para as suas pretensões.

Este é o mesmo protagonista de manchetes escabrosas, nunca inteiramente esclarecidas e aviadas sob o epíteto de "campanha negra". Este é o tiranete que processa jornalistas, o homem que - ao do ministro das finanças que agora humilha - anunciou o "fim da crise" apenas semanas antes da recessão bater.

Num tempo ou num local onde vigorassem os serviços mínimos de um código de honra, Sócrates seria o exemplo daquilo que um verdadeiro homem jamais poderá ser. A estes, os de carácter, exige-se por exemplo a capacidade da vergonha. E a incapacidade de jurar que é da oposição a culpa de estarmos entregues ao FMI por terem recusado subscrever o PEC4 quando na verdade o país precisa de 80 mil milhões de euros (quantos zeros são?) - e esse já enésimo pacote de austeridade nem a uns míseros 5 % desse valor chegaria.

Saber - após tudo isto, e foi um mero resumo - que este José continua a fazer parte da equação, que as sondagens nem sequer o tiram da corrida, que vai de uma forma ou doutra sentar-se à mesa e assim lá teremos, perdoe-se a expressão, de continuar a levar com ele ... é mais ou menos como se um marido traísse a mulher com uma prostituta e a esposa, na tentativa de salvar o matrimónio, ainda tivesse de suportar - em plena consulta de terapia conjugal - com a presença da meretriz.

Dupla desgraça: o país de tanga, e o rei vai nu.

Luís Filipe Borges
in «Tabu», Sol, 21.04.2011